sexta-feira, 4 de novembro de 2011

ABRADES, uma senha para abrir as mentes e os corações!

Quando fui convidado a escrever uma mensagem para o sítio virtual da ABRADES fiquei pensando comigo, ruminando na alma: o que escrever para saudar a diversidade de um espaço de debates que tem a intenção de reunir tanta gente, das mais diferentes formações, desde eminentes e doutos educadores, os estudantes, os pesquisadores chegando até cidadãos e “navegantes” diletantes na grande Teia, todos de alguma maneira interessados nos temas da Educação Afetiva e Sexualidade?
Sei que nesse site haverá múltiplos acessos de muitos professores, estudantes, especialistas, agentes educacionais e cidadãos e cidadãs comuns, que buscarão ali informações, indicações, temas e sugestões para essa complexa área temática da Educação. Como apresentar um texto, uma mensagem que fosse marcante, acolhedora, num universo tão diverso, tão distinto, formado pela pluralidade de pessoas e idéias, experiências e esperanças?
Pensei primeiramente em colocar uma mensagem altruísta, vibrante, entusiasmada, sobre a educação e o papel proeminente do professor no processo histórico de emancipação afetiva e sexual. A fonte de minha mensagem seria a filosofia, a cultura da utopia, as reservas críticas e estéticas que mantemos em nosso estômago ontológico. Declinei rapidamente. Faltava-me também, em minha própria alma, certa reserva de entusiasmo e ufanismo. E a Filosofia não tem assim uma tradição tão acolhedora sobre a Sexualidade, sobre o corpo, embora esse tema tenha raízes atávicas no paradigmático O Banquete de Platão!
Pensei numa perspectiva radicalmente alternativa ou contrária. Meu pensamento logo apresentou a possibilidade de uma palavra de consolo, de apresentação de esparsos cenários positivos, permeado de cuidadosas palavras de alegria e de moderados votos de possíveis vitórias espetaculares. Um apelo militante, inspirado nas adequadas palavras de ordem, nas convicções de muitas batalhas já vencidas e nas promessas de aberturas de outras grandes trincheiras. Também deixei de lado esta possibilidade. Nem a beleza das congratulações nem o comedimento dos consolos convenciam a mim mesmo, muito menos seriam suficientes para a tarefa a que me propus: acolher e motivar!
Os livros, as belas palavras da utopia, o meu crescente entusiasmo pela educação não ofereciam a possibilidade de sustentar uma fonte segura. Eu não estava conseguindo extrair destas fontes a mística da cultura acumulada e nem delinear no horizonte político, um argumento motivador e cheio de luz!
Retomei então, minha suposta habilidade de fazer uma síntese. Queria mesmo evitar a indignação, queria ser um pouco mais leve do que tenho sido, queria abrir e esticar horizontes... Neste momento passaram pela tela de minha memória os tantos e quantos grupos e salas nos quais estive, dando aulas, palestras, conferências e oficinas, os auditórios e espaços de debates e relatos, nos tantos eventos que temos partilhado nestas lidas pela formação de professores nos últimos anos. Lembrei-me dos ciclos de palestras, dos congressos sobre Educação e Sexualidade, das inaugurações de sedes, sub-sedes e bibliotecas, dos cursos de Especialização, das disciplinas em tantos cursos de mestrado e doutorado com temáticas afins, no universo de tantos professores e professoras atentas ao que falávamos, no entusiasmo do apoio, por palavras e agradecimentos gestuais, ao final de cada palestra ou conferência que temos empreendido em 25 anos de luta por esse tema tão caro e tão fecundo: Educação Afetiva e Ética Sexual.
Percebi, num instante, que envelheci no contar dos anos, mas que nunca arrefeci nem me apartei do intento de lutar pela abordagem emancipatória, pela compreensão histórico-crítica dos estudos, temas e dimensões das concepções de Sexualidade e de Educação Sexual. E, para meu saudoso espanto, observei que cada vez mais se tornam atuais as bandeiras e palavras que tenho buscado defender na trincheira da educação e da formação de sujeitos emancipados e emancipadores no campo da Ética, da Sexualidade e Educação Sexual voltada para a humanização e autonomia. Longe de ser uma constatação um tanto narcisista, isto me deixou, de um lado entristecido, de outro, ansioso por encontrar outras pessoas para revitalizar a trilha, o sonho e a esperança, sobretudo na abertura dessa segunda década do terceiro milênio, tempo de plenas potencialidades para nosso campo temático e suas disposições pedagógicas e políticas.
Mas eu queria ainda encontrar alguma fonte outra inspiradora, algo que também a mim pudesse revitalizar e iluminar. E lembrei-me dos olhos brilhantes dos meus alunos e alunas em minhas salas de aulas, dos professores e professoras que tenho visto nos auditórios e cursos; de repente uma seara de uma miríade de olhares brilhantes iluminou a minha alma. Vi o quanto os meus alunos, os meus colegas e os tantos professores, mais ou menos conscientes desta tarefa, buscam encontrar motivações e releituras de suas opções e práticas, de suas convicções e esperanças!
Percebi a onda de energia que deriva do conjunto de professores que se articula ao redor das iniciativas generosas da ABRADES, a querida Associação Brasileira Para a Educação Sexual. Eu queria escrever o nome da ABRADES numa pedra, para lograr eternizá-la como inspiração, mas percebi que se fosse escrita nos corações e nas mentes das pessoas ficaria ainda mais forte! Como um imperativo, não um vocativo. Como um ordenamento existencial, não um simples apelo. Para ser lembrada, para igualmente lembrar que a vida é muito curta e temos que cuidar dela! Lembra-te sempre que a vida passa muito fugazmente, que as coisas são fugidias, que o que vale a pena é quase sempre invisível para os olhos, diria Exupéry.
E quis meu coração deixar uma outra marca na pedra: memento mori – dizia o ditado latino. Lembra-te que vais morrer, seria a tradução direta. Mas, para os que acalentam sonhos e utopias, para os professores que professam sua fé na ética e na estética da emancipação e da autonomia, a raiz do termo “professor” sempre é a mesma das dimensões de profecia e profeta, para os professores que professam a fé na vida, no ensino, na humanização, na cultura da paz e da solidariedade, na comunhão com a terra entre todos os viventes, no milagre da multiplicação da vida a expressão deve, necessariamente mudar, Memento Vivere - lembra-te que deves viver. E viver é mais do que gastar o tempo para prover necessidades, é sobreviver com sentido, com metas, imperativos éticos, estéticos, utopias, razões e paixões. Os professores são os medidores dos sonhos, os esticadores dos horizontes, os profetas das utopias. Lembra de viver, professor. Lembra que a vida é única, sagrada, absoluta, professora. E viver é amadurecer para o ser, sempre...
Foi isto que eu pensei e ousei deixar aqui. Educar Para o Amor, esse gênio entre Poros e Pênia, esse daimon que nos desaloja, que nos impulsiona, que nos humaniza!
Sejam bem-vindos ao Portal da ABRADES
                                                                                        César Nunes. Primavera de 2011.

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